Conspiração neural

Essa é uma história verídica. Chamarei o personagem de John, a única alteração nos fatos.

Eu estava na loja da Fnac vendo as novas máquinas fotográficas digitais, as novas lentes e os preços. Como eram caros.

Queria pegar nas mãos e testar, clicar nos botões, mexer no visor, mudar sua angulação enfim. Mas não era possível. A não ser que eu realmente quisesse comprar.

Com certeza se fosse permitido pedir para tirar da vitrine e alguém poder me mostrar todas as principais funcionalidades, eu teria pedido. Mesmo sem a menor chance de comprar. Seria um tipo de entretenimento.

Nesse caso eu seria um especulador, tomaria o tempo do vendedor com a demonstração e não compraria. Eu, nesse caso, seria um tipo de lead (potencial cliente) especulador, tipo de lead que eu ensino nos meus cursos a fugir!

Na seção de TVs, ao lado da de fotografia, havia umas 20 TVs enfileiradas todas passando a mesma coisa. Um prédio em chamas.

Estranho. Que filme é esse? Aquele prédio é uma das Torres Gêmeas de Nova Iorque. O dia era 11 de setembro de 2001. E aquele não era um filme e sim a tomada de cenas ao vivo do ataque que alterou o mundo.

Encontrei John na hora do almoço. Tínhamos marcado de falar sobre negócios na área de créditos tributários. Era um mercado efervescente. Muitos escritórios estavam criando know how de buscar créditos tributários que pudessem ser compensados com impostos a pagar, diminuindo a carga de impostos das empresas.

John tinha alguns clientes muito grandes e estava conseguindo fazer vingar seus créditos tributários através de liminares judiciais.

John queria mais clientes e essa era a pauta da reunião, como eu poderia ajudá-lo a trazer mais clientes de grande porte que precisassem dos seus serviços.

A conversa do almoço foi centrada na queda das torres, obviamente. Estávamos incrédulos. Mais eu do que John.

-Stavros, o mundo entrará em uma guerra total.

– Será? A quem interessa uma guerra total? A ninguém, John. Os interesses estão em conflitos locais, que possam movimentar a indústria armamentista e a imprensa. Os principais motores da economia.

Se há alguma tragédia acontecendo no mundo, mais TVs são ligadas e os anunciantes “piram”. Isso é clássico.

Tragédias em forma de catástrofes da natureza, guerras e tudo mais que mexe com nossa segurança, é matéria prima base para girar a economia.

Até aí ok. Disso nós sabemos. Mas atacar o coração do centro econômico do pais mais poderoso do planeta é outra coisa. Não me parece um movimento orquestrado pelos donos do jogo. Algo saiu do controle aí.

– Stavros, claro que é um movimento orquestrado. É necessário movimentar a economia. Passamos por várias guerras e essa será mais uma.

Passados 16 anos, hoje todos sabemos das teorias conspiratórias sobre esse ataque, vimos a invasão do Afeganistão e a do Iraque, a deposição e morte de seu ditador, vimos os horrores de Guantánamo, os passos de Bush, a crise mundial e quebra do sistema financeiro em 2008, a primavera árabe, o nascimento do estado islâmico, os refugiados sírios e a sua entrada na Europa. Aqui no Brasil, vivenciamos a ascensão e queda do PT, o fisiologismo e a corrupção elevados à máxima por quase todos os partidos políticos, a economia crescer e encolher e o estado judicializado e policialesco que impregna nossa mídia e a perda de milhões de empregos e empresas.

John continua achando que são movimentos orquestrados. Que existe uma elite mundial que mexe os pauzinhos milimetricamente e desencadeia tremores na sociedade. Por que e para que, ele não sabe explicar. Mas tem a certeza que a causa de tudo é uma deliberação de poucos, os senhores do nosso planeta.

Eu penso o oposto. Esse tipo de conspiração está na mente de John. Que inocente eu sou? Pode ser. Mas gosto de sentir que o verdadeiro dono da minha caminhada é Deus que me deu livre arbítrio para enxergar o mundo da melhor ou pior maneira possível. Quero um modelo mental que me dê a certeza que estou na direção do meu destino.

Voltando ao mundo prático e ao cotidiano, o movimento econômico é espasmódico se tomássemos como base os eventos do último milênio.

Claro que a escassez é artificial para que as coisas tenham valor econômico, mas isso está implícito no modelo, não é algo orquestrado por alguém.

Assim como está no modelo econômico propagar o maior número possível de catástrofes, desgraças, violência, corrupção, prisões, mortes e convulsão social. Há 50 anos se sabe que uma notícia ruim gera muito mais audiência que uma notícia boa. E audiência alta significa mais consumo.

Essa é a natureza humana. Não há nenhuma orquestração. Preferimos nos ver à distância da desgraça do que mais próximos da graça. A mídia nos dá essa sensação.

A conspiração é um tipo de versão da origem dos fatos. Podemos achar que algo aconteceu por motivos escusos e que sempre há alguém manipulando os fatos em benefício próprio. Pode ser.

Mas esse é um tipo de determinismo que não nos ajuda. É do mesmo naipe daqueles que apresentam o mundo que nos passam na TV. Apenas mais uma versão dos fatos.

Tenho mais de 74 livros de vendas na minha estante. Li todos. Alguns mais de duas vezes. Muitos me deixaram um grande legado teórico. Mas em nenhum encontrei a realidade nua e crua, na nossa cultura brasileira, daquilo que acontece em uma sala de reunião de negócios e como se faz para se chegar àquelas que finalizam em um bom contrato.

E é isso que diuturnamente tento passar aos meus alunos. Pois o tamanho do saldo que você tem no banco hoje, depende exclusivamente dessa sua capacidade: fazer o mercado consumir o valor que você gera.

E para tanto, a única conspiração que pode existir está nos nossos neurônios que sempre tendem a atribuir aos outros ou aos fatos que não controlamos a responsabilidade e consequência pelos resultados que alcançamos.

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Stavros Frangoulidis
 

Stavros é o fundador da PaP Solutions, professor da cadeira de "Prospecção de Clientes" da ABEMD e um dos idealizadores do The Client Door. Seu foco está no conhecimento prático - trazendo o par tecnologia+marketing a serviço de uma excelente gestão de vendas com foco em captação e fidelização de clientes.

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